Entrevista com Guilherme Batimarchi, editor chefe da revista Healthers

10836408_785889298151255_947704636_n“Ele te da à possibilidade de ver as coisas de uma maneira diferente, mostrar para todo mundo como você está vendo essas coisas, para onde  você tem que  ir… Tudo isso é muito legal, mas é supérfluo!”

Guilherme Batimarchi, o atual editor chefe da Healthers, revista direcionada para os executivos do setor de saúde no Brasil, compartilhando informações sobre TI, marketing, Compra, Venda, Finanças, RH e CEOs, concedeu uma entrevista ao Saúde Tech para discutir sobre a integração do Google Glass na medicina atual e salientar qual a relevância do dispositivo para o setor de saúde e também fora dele.

Leia a seguir, a entrevista completa com Guilherme Batimarchi e entenda mais saúde e tecnologia.

Isabela Maciel: Qual o investimento brasileiro em tecnologia na saúde atualmente?

Guilherme Batimarchi: O investimento brasileiro em tecnologia na saúde é muito baixo. O panorama em TI no Brasil em saúde hoje em dia é o seguinte: o mercado brasileiro em saúde incluindo o público e privado hoje gasta 400 bilhões de reais, ou seja, esse é o custo total. Desse 400 bilhões 53% estão concentrados na área privada e 46% na área pública. O que é engraçado, e foge do que é comum a qualquer outro mercado mundial. O público deveria investir muito mais.

IM: Porque acontece isso no Brasil?

GB: No Brasil quando você vai falar de área pública, ele tem duas frentes: tem o próprio hospital público e o hospital filantrópico, que por sua vez é privado, com médicos contratados como CLT, só que ele atende SUS. Nesse contexto, ou 60% do atendimento dele é SUS ou ele é totalmente SUS, como é o caso das Santas Casas.

Mas dentro disso, há outro problema: no Brasil existem em torno de 2.500 hospitais filantrópicos e a dívida deles em média hoje é de 5.2 bilhões de reais. Isso acontece porque o governo paga 40% do valor do procedimento de um paciente internado e quanto aos outros 60% a presidência desses hospitais tem que tirar da cartola e por lógica, isso gera um problema financeiro muito grande.

IM: Então com essa baixa de investimento em tecnologia aqui no Brasil, qual a finalidade do Google Glass?

GB: O Google Glass nesse setor nada mais é do que um jeito novo de fazer o que já existe…

IM: Então, o setor de saúde não precisa do Google Glass?

GB: Na verdade, existem muitos médicos entusiastas desse tipo de tecnologia e não é para menos, porque o legal do Glass é o que ele pode suprir, vou te dar um exemplo: você é uma médica que está na Rondônia atendendo os índios. Você já tem alguns anos de carreira, mas você se depara com um caso X que você nunca viu na sua vida, o que fazer? Então, você tira o Google Glass do seu bolso o conecta no seu celular e liga para o seu amigo no Hospital das Clinicas. Você conversa com ele, e fala que está com um caso estranho e pede para ele dar uma olhada, então você liga a câmera e o médico do HC vai ver exatamente o que você está vendo.

Essa possibilidade é sensacional no Google Glass! Então você como médico pode ter uma segunda opinião, além de o Glass ser uma tecnologia completamente móvel, ou seja, ele não precisa de uma antena parabólica ou uma câmera de vídeo adjacente. Nesse aspecto ele é muito legal e ajuda muito melhorar o acesso à saúde e aos médicos por terem acesso a essa segunda opinião.

IM: Então eu posso considerar o Google Glass uma tecnologia revolucionária para o setor de saúde?

GB: Pode até ser, mas para a saúde eu não vejo muito mais funções além dessas que eu falei. No começo desse ano eles lançaram uma lente de contato para diabéticos. Essas lentes medem glicemia, avisa quando você tem que tomar os medicamentos. Especula-se que essa lente de contato pode ser a segunda geração do Google Glass, ou seja, ele vai deixar de ser aquela armação com o visor. Nesse caso você está falando de uma tecnologia diferente, onde você está colando um computador transparente em uma lente de contato. Algo que lembra muito aquele filme Minority Report. Mas isso tudo é uma especulação que você lê na internet e nos blogs por ai. Porque se eles conseguem incorporar um sistema que mede a diabete de um paciente, imagina o que mais eles podem colocar lá.

IM: Como você comentou antes, não há muito investimento em tecnologia no setor de saúde aqui no Brasil. Diante disso, queria saber como está sendo a recepção do Google Glass nessa área? Algum hospital já aderiu a ele?

GB: Até agora eu não vi nenhum hospital usando ele plenamente, mas já vi médicos que foram para eventos de tecnologia fora do país e nessas situações ele usaram e até onde eu sei, eles ficaram extremamente otimistas. Esses médicos com quem eu conversei, realmente gostaram da ideia de usar o Google Glass, acham que ficaria até mais fácil. Então, a recepção deles foi bem positiva, mesmo com o preço altíssimo que essa tecnologia vai chegar aqui no Brasil, em torno de cinco ou sete mil reais… Mas eles estão cheios de expectativas.

IM: Qual a sua maior crítica sobre o Google Glass?

GB: Bem, eu não diria que é uma crítica, é mais um receio meu. O Google Glass tem o mesmo sistema de interatividade do Iphone, que inclui também, o comando de voz, mas até que ponto esse comando de voz vai conseguir interpretar o que o usuário está tentando dizer. Porque o comando de voz do Iphone da uns probleminhas… E tem outra coisa, se ele é um negocio para ficar no seu olho, porque ele é touch screen? Por que eu tenho que encostar nele se a ideia é justamente ter a mão livre? A minha única ressalva que eu tenho, é justamente essa.

IM: Em que momento a tecnologia, dentro desse setor, deixa de ser um benefício para se tornar um problema?

GB: Eu diria que a TI passa a ser um problema quando você prioriza a tecnologia deixando a integração com a parte clínica de lado. Não adianta você dizer que quer Google Glass, tablet, cirurgia robótica e que está disposto a pagar o preço que for, mas no fim a sua equipe não está preparada, você não tem uma demanda para cirurgia robótica, Google Glass, tablet? Você tem uma governança de TI para receber esse tipo de serviço? Então se você fizer tudo isso sem essa preparação, você congela o seu hospital, tudo para! Você é obrigado a qualificar a equipe, ter uma estrutura de TI para isso, você precisa de espaço, ou seja, é preciso de um centro cirúrgico de no mínimo cem metros quadrados para ter um robô lá dentro, precisa de manutenção, segurança de rede. Em resumo, ela passa a ser um empecilho se ela for mal gerenciada ou se ela for negligenciada também.

IM: Dominamos a tecnologia ou somo dominados por ela?

GB: Acho que nem um nem outro. Eu acredito que dominamos a tecnologia até certo ponto, ou seja, desenvolvemos novos gedgets, nos o usamos da forma adequada e isso é bacana, isso é o domínio.  Agora ser dominado pela tecnologia é ficarmos absolutamente dependentes dela…

IM: E nós não somos dependentes dela?

GB: Não deveríamos ser. O setor de saúde, principalmente, no Brasil tem uma defasagem em tecnologia nas universidades muito grande. Então, o cara aprende a fazer raios-X de filme, então se de repente der algum problema na maquina de tirar raios-X, esse médico sabe como se virar, ele consegue fazer o laudo sem o exame digital. Dentro da saúde existe essa preocupação, se caiu o sistema, se quebrou alguma máquina, os caras tem que estar preparados para continuar trabalhando. Não importa se vai demorar mais ou se o procedimento será mais complicado, esse paciente tem que ser atendido, com ou sem TI.

IM: E fora dela?

GB: Fora desse setor, muda completamente! Mas, eu não digo que somo escravos, mas com certeza nós somos totalmente dependentes dela. Por exemplo: Eu quero acessar o meu e-mail, mas estou sem rede! Isso é uma dependência. Rotineira, mais não deixa de ser uma forma de dependência.

Isabela Maciel: Qual o tipo de recepção que o Google Glass pode encontrar?

Guilherme Batimarchi: Ele corre o risco de encontrar muita resistência em telemedicina, por exemplo. Isso, porque se trata de uma tecnologia super inovadora, que não é especificamente para esse setor. Então, “eu nunca ouvi falar desse negócio, não é para a saúde, e para que serve isso?”, “Porque eu preciso de um Google Glass?”. É engraçado isso, porque parece que estão sendo lançada no mercado uma nova onda de dispositivos que na verdade não servem para nada, mas todo mundo quer ter um… Pior ainda! Precisam de um! Para mim, esses relógios que estão no mercado, como o Iwatch, por exemplo, tem muito mais utilidade do que um Google Glass.

Não estou dizendo que o Google Glass não legal ou interessante, muito pelo contrário, ele é bacana. Ele te da à possibilidade de ver as coisas de uma maneira diferente, mostrar para todo mundo como você está vendo essas coisas, para onde você tem que ir… Tudo isso é muito legal, mas é supérfluo! Eu posso fazer tudo o que ele me proporciona através de outras tecnologias e sem gastar nada! Ainda sim, eu adoraria ter um, mas se você me perguntar “Para que serve um Google Glass?”. Minha resposta seria: “Eu não faço a mínima ideia!”.

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